Lauro Lisboa Garcia -
No início da década de 1970, a barra estava pesada pra todo mundo que não alinhasse com a ditadura militar, que prendia e arrebentava. Com os Novos Baianos não foi diferente. Ter cabelos longos bastava para ser preso. E alguns deles tiveram as cabeças raspadas na passagem pela Prisão da Misericórdia, em Salvador. Era o fim dos dias de paraíso em Arembepe, que ainda era uma "aldeia" baiana. Eles pensaram em deixar o País, como tantos outros que fugiam da repressão.
Mas, para sorte da canção brasileira, o desembarque dos bichos depois do dilúvio se deu no Rio de Janeiro, onde eles criaram um dos discos mais potentes de todos os tempos, Acabou Chorare, de 1972. Em qualquer enquete com especialistas, esse álbum - que chega às bancas no próximo domingo dentro da Coleção Grande Discoteca Brasileira do Estadão - figura seguramente no top 5.
Não é surpresa que ele tenha ficado no topo da lista da revista Rolling Stone em 2007, numa grande votação para escolher os 100 melhores discos da música brasileira de 2007, batendo Tropicália e Chega de Saudade (João Gilberto). Com o dengo de Moraes Moreira, a faixa-título Acabou Chorare é uma bossa totalmente influenciada por João, que frequentava o apartamento dos Novos Baianos em Botafogo.
Moraes, Baby Consuelo, Galvão, Paulinho Boca de Cantor, Pepeu Gomes e toda a trupe, que incluía ainda Dadi, Jorginho, Baixinho e Bolacha, assimilaram as lições do mestre baiano e seus seguidores (Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil) e foram adiante.
Representantes mais expressivos da segunda geração tropicalista, eles colocaram o samba de volta no centro da roda com guitarra de rock, viagens instrumentais e choro turbinado. Como Tropicália, até hoje reverberam suas influências na linguagem moderna do samba com pegada roqueira. Canção emblemática do disco, Preta Pretinha, segundo conta Galvão na biografia Anos 70 - Novos e Baianos, está registrada no Museu da Imagem e do Som como uma das dez músicas mais populares do Brasil.
Hoje esquecido pelos conterrâneos, o baiano Assis Valente é o que dá pontapé inicial à vitoriosa investida do grupo, com o clássico Brasil Pandeiro, que se escancarou para uma geração.
Baby alucina no baião-rock Tinindo Trincando e em A Menina Dança, Pepeu esmerilha (uma expressão da época) a guitarra em Bilhete pra Didi, Paulinho vai fundo em Swing de Campo Grande e Mistério do Planeta e por aí vai. E quem resiste ao suingue de Besta é Tu? Pode comprovar: 38 anos depois, o disco inteiro soa novíssimo. Brilhante.
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